Concursos públicos e os superqualificados

Ocupar um cargo público parece que se tornou uma obsessão para uma grande parte dos jovens de nosso país. Já escrevi sobre o assunto aqui em outras oportunidades (Serviço público ou iniciativa privada?, Mercado ou mestrado?), que é cheio de prós e contras, dependendo do foco e visão de mundo de cada um. Infelizmente, o que constato conversando com alguns que se candidatam a vagas em serviço público é que querem estabilidade no emprego rapidamente, algum plano de saúde aceitável e garantia de aposentadoria lá no final da carreira. Mesmo que para isso tenham que engulir um salário abaixo do que é pago no mercado privado para as mesmas funções, ou que tenham que ficar desempenhando as mesmas funções sempre, dia após dia.

imagesMas, tenho observado algumas distorções que considero mais graves. Por exemplo, em recente concurso para Assistente  Administrativo com que tive contato (vejam as atribuições e descrição do cargo aqui),  uma pessoa que conheço, com curso superior completo e mestrado na área, fez o concurso e obviamente, foi aprovado. Bom, mas será que uma pessoa com esse investimento todo em formação superior, não é um enorme desperdício de talento para ocupar uma função que claramente exige nível médio de ensino? Será que a pessoa aguenta ficar nesse cargo a vida profissional inteira? Esse é o caso do superqualificado: um candidato com uma qualificação muito acima do que a exigida pela vaga em questão se candidata, concorre com vantagens em relação aos demais candidatos que têm a qualificação adequada para o cargo, é contratado, e ai? Fica uns meses no cargo, e depois pula fora, pois não aguenta o tranco. E isso é perfeitamente previsível, na gestão de pessoas é considerado uma falha dos editais. E ai começa tudo novamente, outro concurso, mesmo edital, e a estória se repete. Um artigo interessante sobre essa rotatividade, publicado recentemente no Correio Braziliense, pode (e deve, recomendo) ser lido aqui.

O desgaste é muito grande, são recursos públicos desperdiçados com concursos que previsivelmente vão ter que ser repetidos. Não seria mais razoável incluir nos editais, além da qualificação mínima exigida, incluir também a qualificação máxima aceitável? Pode parecer estranho, mas é uma prática comum em outros países, protegendo assim antes de mais nada o próprio estado, e também os demais candidatos que não poderiam nunca se candidatar a vagas com níveis de exigência mais altos por não terem a formação adequada. Ao passo que o superqualificado teria um leque maior de opções diante dele, e prejudicando o de formação mais fraca. Pensem bem: se eu tenho mestrado e me inscrevo em um concurso em que a exigência mínima é segundo grau completo, eu levo uma vantagem imensa logo de cara, e tiro chances dos candidatos que têm apenas o segundo grau e certamente têm o perfil adequado para a função. Vou passar, e depois vou ficar instatisfeito, e em pouco tempo vou tentar arrumar outro concurso para fazer.

Parece que, de uns tempos para cá, ficou proibido proibir qualquer coisa. Um edital de concurso público que coloca apenas o limite inferior como qualificação para se candidatar, é o que eu chamo de edital de “seleção inclusiva”: todo mundo incluido, ninguém pode ficar de fora. Completamente fora de propósito, na minha opinião!

(este artigo foi escrito por zeluisbraga, e postado no meu blog zeluisbraga . wordpress . com) (this post is authored by zeluisbraga, published on zeluisbraga . wordpress . com) (Viçosa, MG)

Consultor Independente, Treinamento Empresarial, Gerência de Projetos, Engenharia de Requisitos de Software, Inovação. Professor Titular Aposentado, Departamento de Informática, Universidade Federal de Viçosa, Minas Gerais, Brasil. Doutor em Informática, PUC-Rio, 1990. Pós-Doutoramento, University of Florida, 1998-1999

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Publicado em Economia, Opinião, Reflexões, Social
8 comentários em “Concursos públicos e os superqualificados
  1. Uma dúvida Zé, um limite superior seria ilegal?

  2. Quando um superqualificado sai buscando algo melhor, tem a questão dos gastos e tudo, mas o pior é quando o cidadão se acomoda em um cargo desses. Se foi formado pelo estado então, 7 anos jogados no lixo, imagina o tamanho do prejuízo.

  3. luizpcf disse:

    Interessante colocar limite superior, esse problema é real e acontece com frequência, mas será que não seria mais relevante se o Governo parasse de aceitar esses saltos de concurso em concurso? Se, a partir do momento que o cara for efetivado em uma vaga, ele ficaria impossibilitado de se efetivar em outra vaga em um prazo de dois anos, por exemplo?
    Isso iria diminuir drasticamente a quantidade de pessoas que fazem carreiras de concurso, eles iriam pensar duas vezes em aceitar ou não a vaga se ele fossem proibidos de pegar outro concurso que recebe mais em pouco tempo…

    • Talvez esta seja outra medida necessária. Mas será que com os governantes atuais do pais, essas medidas seriam adotadas?

    • luizpcf disse:

      Hoje foi um dia interessante.
      Tive um encontro com o Governador de Minas Gerais e tivemos a oportunidade de explicar para ele qual a proposta da startup que estou começando. https://www.facebook.com/OProjetoBrasil

      Nessa conversa o Governador comentou que ele foi parlamentar por 16 anos, e nesse período ele nunca foi procurado por qualquer pessoa, seja eleitor dele ou não, para sugerir um projeto de lei.

      Será que não falta talvez a gente começar a procurar esses caras e fazer esse tipo de sugestão?

      Existem projetos como o Votenaweb(http://www.votenaweb.com.br/) que tem como objetivo divulgar o trabalho de parlamentares, e alguns tem mudado a sua posição na assembléia devido a posição da população que ele representa. Por exemplo o Romário e o Popó, que tem tudo para serem um parlamentar somente que levam votos por serem celebridades a parlamentares que fazem a diferença.

    • luizpcf disse:

      Escreve rápido e não revisa antes de enviar da nisso, não tem como editar então retificando aqui:

      Por exemplo o Romário e o Popó, que tinham tudo para serem parlamentares que somente levam votos por serem celebridades e estão se tornando parlamentares que fazem a diferença, propondo projetos relevantes.

      Só ver por exemplo as propostas antigas e mais recentes do Popó no votenaweb e ver a evolução dele como parlamentar:
      http://www.votenaweb.com.br/politicos/acelino.popo

  4. Geraldo Cruz disse:

    Esta adoção explanada pelo Luiz é interessante, acredito que reduziria bastante, mas os legisladores têm interesse em não modificar. E neste caso, também, estaria infringindo a Constituição, portanto, é necessário que os “homens das Leis” queiram alterá-la.
    Art. 3º …..promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação…
    Questão que, sem a alteração, é favorável a qualquer um.

    A nossa mudança tem de começar a acontecer em OUT/2014.

    Precisamos rever a nossa forma de legislar, executar e julgar. Precisamos resgatar valores, que se perderam nós últimos 30 / 40 anos.
    Imagina o que teremos/seremos daqui a mais 30/40 anos.

    Podemos observar o caos ocorrendo TODOS os dias, em TODAS as esferas…e em TODA a sociedade.

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